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O estuário de Santos não teve o que comemorar no Dia Mundial da Água


Águas contaminadas por lixo e esgoto. Falta de moradia e tratamento de esgoto são os principais motivos que levam o estuário de Santos ao caos ambiental.

No Dia Mundial da Água, 22 de março, a região do estuário de Santos, na Baixada Santista (SP), não teve muito o que comemorar. O manguezal, seu maior patrimônio natural, que abriga rica biodiversidade e presta serviços ambientais fundamentais para a região, está sendo desmatado e contaminado devido às invasões de palafitas, que despejam esgoto e todo o tipo de lixo em suas águas.

Milhares de crianças ainda convivem muito com lixo e esgoto no estuário de Santos.

Milhares de crianças ainda convivem muito com lixo e esgoto no estuário de Santos.

Segundo estimativas de líderes da própria comunidade do Dique da Vila Gilda, em Santos (onde concentra-se a maior parte desse tipo de habitação) existem aproximadamente 40 mil pessoas vivendo em condições precárias, expostas ao lixo e ao esgoto. E, apesar de básico em sua denominação, nas palafitas da baixada santista o saneamento básico é algo inexistente em pleno século XXI, sendo o poder público impedido de oferecer as mínimas condições de salubridade e saúde para a população. É de conhecimento de todos que sem saneamento básico não há saúde. Sendo que, tratando-se de uma região estuarina, sem o saneamento básico e habitação também não existe preservação das suas águas, respeito à biodiversidade presente nos manguezais, berçário da vida marinha, e consequentemente aos ecossistemas marinhos da região, que recebem esse enorme aporte de lixo e esgoto diariamente.

Além de poluir a água, propiciando a ocorrência de doenças de veiculação hídrica, como gastroenterite, amebíase, giardíase, febres tifoide e paratifoide, hepatite A e cólera, o lixo e o esgoto atraem e contribuem para a proliferação de animais e insetos que se tornam vetores de doenças como a dengue, chikungunya, zica, leptospirose, febre da mordida de rato, peste bubônica, tifo murino, salmonelose, sarnas e micoses.

Além de poluir a água, propiciando a ocorrência de doenças de veiculação hídrica, como gastroenterite, amebíase, giardíase, febres tifoide e paratifoide, hepatite A e cólera, o lixo e o esgoto atraem e contribuem para a proliferação de animais e insetos que se tornam vetores de doenças como a dengue, chikungunya, zica, leptospirose, febre da mordida de rato, peste bubônica, tifo murino, salmonelose, sarnas e micoses.

O Instituto EcoFaxina, entidade sem fins econômicos e de utilidade pública de Santos (SP), atua desde 2008 com o objetivo de levar informações à população que vive em palafitas e articular parcerias com o poder público, visando a recuperação das áreas degradadas de mangue. Em um de seus projetos está prevista a limpeza e reflorestamento do local, gerando renda com a reciclagem para os jovens em situação de vulnerabilidade social, habitantes de palafitas.

A recuperação de áreas degradadas de mangue, se atrelada a políticas públicas habitacionais, tem como objetivo tornar-se uma ferramenta de congelamento das favelas, auxiliando a Defesa Civil no trabalho de contenção das invasões.

A recuperação de áreas degradadas de mangue, se atrelada a políticas públicas habitacionais, tem como objetivo tornar-se uma ferramenta de congelamento das favelas, auxiliando a Defesa Civil no trabalho de contenção das invasões.

“Todos os dias, milhares de famílias que vivem em palafitas descartam seus resíduos no manguezal, juntamente com fezes, urina, óleo de cozinha, produtos de limpeza, etc. O mar se tornou uma densa sopa de plástico misturado ao esgoto em nossa região, que é muito frequentada por diversas espécies marinhas, como tartarugas marinhas e golfinhos, por exemplo”, comenta o presidente do Instituto EcoFaxina, William Rodriguez Schepis. “As crianças nadam nessas águas contaminadas, repletas de resíduos cortantes e perfurantes, ficam expostas a diversos patógenos e acabam ingerindo a água contaminada, podendo contrair diversos tipos de doenças de veiculação hídrica”, salienta.

O mangue poluído é a "praia" da maioria das crianças que vivem em palafitas.

O mangue poluído é a "praia" da maioria das crianças que vivem em palafitas.

Diferentemente de casas em áreas urbanizadas, que possuem ruas, e serviços de coleta de lixo e esgoto, como é normal, os moradores das palafitas, que ocupam áreas onde antes haviam árvores de mangue e uma enorme biodiversidade, contam apenas com a maré para levar seus dejetos. Os próprios comentam que ela é o lixeiro para eles. “O lixo que vemos nas praias não é apenas descaso de turistas ou de navios, como muitos munícipes pensam. Cerca de 90% do que é recolhido diariamente com tratores nas praias vem de favelas de palafitas que ocupam os manguezais do estuário. Ou seja, temos um esgoto a céu aberto, com as marés se encarregando de levar os dejetos, que vão parar nas praias e são responsáveis pela morte de uma série de animais marinhos que confundem o plástico com alimento. Plástico esse, que exposto aos poluentes presentes na água, concentram substâncias químicas bioacumulativas, que são transferidas para pescados e frutos do mar, e consequentemente, para as pessoas que se alimentam desses organismos.”, ressalta William.

Na questão ambiental, o gerenciamento integrado de resíduos sólidos na Baixada Santista está diretamente atrelado à questão da moradia.

Na questão ambiental, o gerenciamento integrado de resíduos sólidos na Baixada Santista está diretamente atrelado à questão da moradia.

Emissário submarino e tratamento de esgoto

Além do problema das palafitas e ligações clandestinas de esgoto na rede pluvial, outra questão que afeta o mar da baixada santista é o esgoto de Santos e São Vicente lançado pelo emissário submarino de Santos. Diariamente são lançados cerca de 432 milhões de litros de esgoto sem tratamento no meio da baía de Santos a uma profundidade de apenas 8 metros, não permitindo uma dispersão eficaz, ocasionando a concentração de poluentes e maior proliferação de algas devido à alta concentração de nitrogênio e fósforo, o que contribui para a turbidez da água. O indicado seria prolongar em mais 7,6 quilômetros os atuais 4,4 quilômetros, totalizando 12 quilômetros de tubulação, atingindo assim a isóbata de 20 metros de profundidade.

O prolongamento do emissário até a isóbata de 20 metros aumentaria substancialmente a capacidade de diluição do efluente tratado e a eficiência degradativa do ambiente marinho, gerando benefícios ecológicos diretos e indiretos para a vida marinha, e consequentemente para a saúde humana, o turismo e a pesca.

O prolongamento do emissário até a isóbata de 20 metros aumentaria substancialmente a capacidade de diluição do efluente tratado e a eficiência degradativa do ambiente marinho, gerando benefícios ecológicos diretos e indiretos para a vida marinha, e consequentemente para a saúde humana, o turismo e a pesca.

Atualmente o efluente não passa por nenhuma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE), contando somente com uma Estação de Pré-Condicionamento (EPC) com gradeamento para a retirada de sólidos e cloração. O indicado seria um tratamento utilizando aeração, tanques de carbono ativado, ozônio, peróxido de hidrogênio, radiação ultravioleta e biorreatores com membranas, compondo um sistema de tratamento eficaz não só para a retirada de matéria orgânica e bactérias, mas também nitrogênio, fósforo e poluentes emergentes como remédios e hormônios.

Um estudo publicado em 2016 na revista americana Science of the Total Environment (Ocorrência de fármacos e cocaína em uma zona costeira brasileira), conduzido por pesquisadores da UNIFESP, UNISANTA e UNESP, constatou a presença de 32 substâncias farmacológicas na saída do emissário submarino de Santos. Entre os fármacos mais presentes, estão os anti-inflamatórios e os anti-hipertensivos, além de cafeína e cocaína, substâncias ausentes nos parâmetros de controle dos órgãos ambientais e previstos pela legislação.

Esse é um questionamento antigo na região, e a CETESB já questionou o Plano Municipal de Saneamento Básico de Santos, por exemplo, que foi aprovado em 2010, contemplando a prática de se manter apenas o pré-condicionamento dos esgotos antes de seu encaminhamento para emissários submarinos.

O Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente (GAEMA) – Baixada Santista do Ministério Público Estadual possui uma ação civil pública, aberta em 2008 contra a Sabesp, para que a estatal trate adequadamente o esgoto de Santos e São Vicente.

Ações voluntárias

Reunindo diversos voluntários, o instituto realiza mensalmente ações de coleta de resíduos pelos manguezais da baixadas santista e também em praias ou locais de preservação ambiental. Até o presente foram realizadas 81 Ações Voluntárias EcoFaxina, que já retiraram mais de 43 toneladas de lixo, como embalagens plásticas, embalagens de leite, tampinhas de garrafas, brinquedos, fraldas e até seringas, remédios, pinos de cocaína, ou mesmo resíduos maiores como televisores, colchões ou sofás. Na última ação, realizada no mangue da Zona Noroeste de Santos e que contou também com a participação de voluntários do Greenpeace, foram recolhidos 756 quilos de lixo, em sua maior parte composto por materiais leves como isopor e plástico.

Voluntários do Greenpeace de São Paulo participam regularmente das ações, contribuindo na divulgação de informações sobre a problemática e a causa defendida pelo Instituto EcoFaxina.

Voluntários do Greenpeace de São Paulo participam regularmente das ações, contribuindo na divulgação de informações sobre a problemática e a causa defendida pelo Instituto EcoFaxina.

“É incrível o que recolhemos nas ações. É uma situação muito degradante e é inaceitável que os órgãos públicos responsáveis não estejam vendo e dando apoio”, comenta William. “Um dos objetivos do Instituto EcoFaxina é mostrar a origem de toda essa poluição que afeta os ecossistemas marinhos da região, levar informação e conscientização, mostrando que nossos governantes precisam promover mudanças estruturais para mudarmos essa situação absurda em que se encontra o nosso estuário. Enquanto tais mudanças não ocorrerem, torna-se muito complicado falarmos de educação ambiental para pessoas que não têm o básico para a sua dignidade e manutenção de sua saúde, que é moradia e saneamento. Por isso estamos lutando também junto às prefeituras por projetos habitacionais que possam oferecer condições dignas a essas pessoas que vivem em palafitas no manguezal”, afirma.

As Ações Voluntárias EcoFaxina são uma forma de chamar a atenção da população e do governo para o grave quadro de poluição por resíduos sólidos que existe em nos mangues e no mar. Ao mesmo tempo conseguem retirar o máximo possível de plástico presente nos ecossistemas costeiros e marinhos da região. São também uma ferramenta de pesquisa e educação ambiental, que por meio da sensibilização e do trabalho em equipe, propiciam uma nova perspectiva do problema para quem os acompanha. “É uma intensa troca de informações e experiências que promove a real perspectiva do problema na população”, afirma William Schepis.

Para conhecer um pouco mais sobre a situação do local, assista ao vídeo realizado pelo Grupo SAL para o Canal OFF: https://youtu.be/Hycq_6scZ88. Confira também mais informações no site www.institutoecofaxina.org.br.

O Instituto EcoFaxina é uma Organização Não Governamental, sem fins econômicos, que desenvolve suas ações através de doações. Se você quiser se associar e contribuir com a causa, acesse: https://www.institutoecofaxina.org.br/doacoes.

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