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Por que precisamos exigir tratamento do esgoto em emissários submarinos


O emissário submarino da Barra entrará em funcionamento despejando (inicialmente) 900 litros por segundo (ou 77 milhões de litros por dia) de esgoto bruto, no mar da Barra.

Na opinião de alguns, este volume seria diluído no mar, e assim não afetaria a qualidade da água na praia da Barra, ou aos ecossistemas presentes na região. Um estudo recente foi realizado por Abessa et al. (2005) *, sobre o efeito do emissário submarino da baía de Santos onde o esgoto também é despejado sem tratamento.

Em Santos o emissário submarino lança esgoto a 4 quilômetros da praia (1 km a menos que a distância do emissário da Barra) com um volume de até 7.000 litros por segundo. Pesquisadores da Universidade de São Paulo, em colaboração com cientistas do U.S. Geological Survey publicaram um estudo sobre o efeito do emissário no sedimento da Baía de Santos, para determinar se há poluição proveniente do esgoto. Descobriu-se que há um acúmulo de sedimentos, mudando a ecologia local e afetando a indústria pesqueira da região. Existe também uma forte correlação do lançamento de esgoto com a mortalidade de pequenos crustáceos que compõem a base da cadeia alimentar, e com elevados níveis de toxicidade do sedimento em áreas adjacentes à saída do emissário. O resultado do estudo foi a constatação de que o emissário está efetivamente afetando a qualidade da água, a ecologia e a economia local. A recomendação dos cientistas é a instalação de uma estação de tratamento para o esgoto do emissário de Santos o mas rápido possível.

Na Austrália, o país onde existem mais emissários submarinos no mundo, todos eles têm no mínimo estação de tratamento secundária (onde um tratamento biológico é adicionado removendo até 90% de bactérias), exceto em Sydney. O emissário de Sydney foi instalado nos anos 70 somente com tratamento primário, porque de acordo com o governo se gastaria muito para fazer uma estação de tratamento secundário. Passados quase 30 anos, e comprovado o efeito nocivo na ecologia afetando o turismo, pesca e economia local, o governo de Sydney estará gastando 6 bilhões de dólares para converter a estação em tratamento secundário **.

No Brasil uma praia é considerada balneável com um índice de 1,000 coliformes fecais por 100 ml de água, 10 vezes mais do que nos EUA. Os níveis de coliformes fecais em esgoto bruto são de 10.000.000, e com tratamento primário 1.000.000. Coliformes fecais são organismos que ocorrem normalmente na flora intestinal humana, e assim funcionam como um parâmetro para a quantidade de esgoto presente na água. Porém, a ausência de coliformes fecais não é uma indicação de ausência de organismos que provocam doenças. A hepatite A, por exemplo, pode sobreviver por 100 dias em água salgada ***.

Emissário submarino do Rio Vermelho, em Salvador.

Emissário submarino do Rio Vermelho, em Salvador.

Além dos efeitos nocivos para a saúde do banhista, há que se preocupar com a saúde do mar também. O mar, ao contrário do que se pensa, não é estação de tratamento de esgoto, nem reservatório de lixo. O mar não “trata” o esgoto, até porque há mais do que coliformes fecais no esgoto, há também detergentes, gordura, fármacos, poluentes químicos e metais pesados que poluem o mar e impedem a degradação de material orgânico. O emissário submarino desloca a poluição para um lugar onde nós não podemos ver o efeito que ela causa. Temos que olhar além do nosso poder míope de avistar a poluição em nossos horizontes, e exigir do governo que nos proporcionem praias limpas e oceanos saudáveis.

No Arquipélago das Cagarras, ilhas que ficam próximas ao lançamento do esgoto do emissário submarino de Ipanema, baixa diversidade de alguns animais marinhos já pode ser observada. Segundo pesquisadores do Museu Nacional/UFRJ, a baixa qualidade da água é uma possível causa para essa redução na biodiversidade local. Pesquisas com esse foco serão iniciadas na região.

*Influence of a Brazilian sewage outfall on the toxicity and contamination of adjacent sediments (2005). Marine Pollution Bulletin 50:875-885 **Beder, Sharon. Getting into Deep Water: Sydney´s Extended Ocean Sewage Outfalls (1992). A Herd of White Elephants: Australia´s Science &Technology Policy: 62-74 ***Environment Sub-Committee Inquiry into Sewage Treatment and Disposal. www.sas.org.uk. MONTEIRO L and MURICY G, 2004. Patterns of sponge distribution in Cagarras Archipelago, Rio de Janeiro, Brazil. J. Mar. Biol. Ass. U. K. 84: 681-687.

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